Por
Xico Sá
xicosa@uol.com.br
Segundona
sem lei. Sim, a cabeça doi, mas toda ressaca, pensando bem, é de
fundo moral.
Não
há ressaca somente física. Alguma você aprontou amigo. Minha
princesa, tem certeza de que não esculhambou com o pretendente,
ainda na pista de dança?
E
aquele SMS ali na hora em que cantam os sabiás da madruga? Relaxa,
você estava mesmo a fim do rapaz e, que feio, ele mais uma vez fugiu
à melhor das lutas. Nada demais, amiga, esquece.
Você
esculhambou com o colega da firma, caro Pereira, disse que o mala não
tem redação própria. Você fez piadas sexistas, Pereira, não é
do seu feitio, meu velho camarada.
Toda
ressaca é moral. Algum rastro você deixou pelo caminho. De esterco,
é claro, afinal de contas, como diz aquela sabedoria, é fazendo
merda que se aduba uma vida.
Você
não é disso, de armar barraco no almoço da casa da sogra, mas
ouvir o pai dele falar mal de gay em pleno domingo da parada GLBT foi
demais, o fogo da correção subiu-lhe às ventas.
Toda
ressaca, se for pesada, é também um belo exercício de metafísica.
Você fica ali estudando as razões de ser. A conclusão é cruel:
bebo, logo existo.
Depois
dos 40, no entanto, a ressaca não é mais uma simples doença de
rotina. É uma dengue sartreana, uma praga existencialista, um
massacre sobre os ossos e os neurônios, que nos leva à fronteira
entre o ser e o nada.
Mas
a ressaca, amigo, com a sua milagrosa inércia possui muitas
vantagens, não vamos demonizá-la em plena segundona.
A
ressaca combate, no que pode, a mais-valia –exploração selvagem
do patrão, que lhe paga uma merreca e vende o que você faz com um
lucro medonho.
No
plano sentimental, a ressaca evita, por exemplo, que façamos novas
besteiras logo na manhã seguinte. Não dá para se bulir não,
doutor, deixa quieto.
De
ressaca um homem pede perdão pelo que fez, pelo que acha que fez e
por tudo que lhe é atribuído no B.O. do lar doce lar no dia
seguinte. Eu acuso! J'Accuse, berra a madame, com mais razão que o
Émile Zola no livro homônimo francês.
No
fim dos porres, esse estágio pré-sal da ressaca, o macho durão
chora e já ensaia o arrependimento –além de beijar na boca os
amigos e dizer que todos são os irmãos que ele nunca teve.
O
melhor, a felicidade suprema, é quando a mais grave acusação
feminina não passa da clássica “você também, seu amador, vai
beber sem comer”. Ufa!
Claro
que de manhã, só o balde de café como testemunha, você vai ouvir,
vagabundo. A gente faz tudo pelo nosso Alzheimer alcóolico, mas elas
acordam como um verdadeiro Pró-Memória, tombando tudo, preservando
todos os acontecimentos da véspera.
Foi
mal, amigo, agarrar “aquela piranha” na frente dela, acontece.
Para estas e outras ocasiões de desculpas é que os bravos
agricultores de Holambra cultivam latifúndios de flores. Levanta-te
dessa ressaca e anda, cachaceiro Lázaro, ela merece todos os
bouquets e arranjos do mundo.
É,
amiga, só uma aniquilante ressaca, além de um belo ensaio de
chifre, é óbvio, humanizam um homem. Digo, tornam o miserável pelo
menos mais sensível.
Que
a segunda, com ou sem ressaca, lhe seja leve.
Hoje não é segunda, mas ressaca não tem dia pra acontecer rsrsrs
ResponderExcluiré fazendo merda que se aduba uma vida...
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