terça-feira, 28 de fevereiro de 2012

Aquele bar



Por Mário Prata



- Mas, está aberto?


Era – e é e será – o único bar do mundo que a gente nunca sabia se estava aberto ou fechado. Tinha que arriscar. Podia dar sorte.


O Bar do Mario, lá na Floriano Peixoto, uma das mais extensas avenidas de Lins, no interior de São Paulo. Normalmente não estava aberto. E não adiantava bater na janela do Mario – que morava no fundo do bar com a mãe e uma porção de irmãos e irmãs – que, se estava fechado, fechado ficava.


Tudo japonês.


Jamais saberemos porque o Mario não abria o bar de vez em quando. Ou de vez em sempre. Às vezes, não abria apenas por um dia. Outra, ficava uma semana fechado. Um mês. E, ultimamente, meses. Não abria e pronto.





O mais interessante é que, mesmo com isso, nunca perdeu a freguesia. Se aberto estava, aberto ficava até o sol bater na porta. Era – e é e será – o bar dos boêmios da minha cidade. Outra característica: o Mario nunca explicou a sua idiossincrasia para abrir ou fechar o bar. Mesmo porque, duvido que ele saiba o que é idiossincrasia.


O Mario fazia um sanduíche que era para disfarçar as milhares de garrafas de cerveja – estupidamente e casco escuro – que a gente consumia. O sanduíche – o melhor que já comi na minha vida – não tinha nome. Era sanduíche mesmo. E mais: só tinha aquele. Daqueles que comidos escorrem pelos dedos, pelo pulso, vai caindo coisa na calça e depois a gente ainda chupa os dedos. Era um sanduíche que a gente comia e bebia. Era quase líquido.


Tinha de tudo o sanduíche. Ali, dentro do pão da padaria da esquina, você podia encontrar um bife, ovos, alface, cebola, moscas, bacon, presunto, molho japonês e – pasmem – peixe cru. Tudo feito numa rapidez incrível pelas mãos do Mario, nem sempre muito limpas. Às vezes a irmã, o irmão ou a mãe se arvoravam a confeccionar o sanduíche. Mas não era a mesma coisa. Faltava a cabeça do Mario. E, sejamos sinceros, alguns fios de cabelo.


Estou contando essa história toda porque outro dia eu estava passando ali numa rua do Itaim, em São Paulo, e vi lá uma placa. Bar do Mario. Como o do japonês: sem acento. Parei e entrei. Esse Bar do Mario estava aberto e era madrugada. Espanto: lá dentro, umas duas ou três gerações de linenses. Aqueles mesmo amigos lá do interior. Muitos sanduíches depois, muitas vidas passadas a limpo, muitas barrigas acima da cintura (e abaixo), muita história pra contar, a verdade.


Foi isso. Todos aqueles freqüentadores do bar lá do interior se juntaram e resolveram abrir um bar aqui, em homenagem ao meu xará. E trazer, pra cá, o Mario Japonês para, sem falta e já sem cabelos (comemos todos eles) fazer o seu sanduíche pra turma da capital.


O Mario topou. Só que nunca se sabe se o Mario veio ou não naquela noite. Às vezes falta um dia, uma semana, um mês. Mas quando vem...


E, como sempre, há mais de quarenta anos, não dá a menor explicação. Mesmo porque nunca ninguém perguntou o motivo dos seus fechamentos e desaparecimento.


Tem gente que freqüenta o sanduíche há três décadas e nunca teve a felicidade de encontrar o Mario. Dizem até, as más línguas, que o Mario não existe.


Posso garantir que já vi o Mario algumas vezes. Tanto no bar de Lins – quando abria – como no do Itaim, quando ele vem.

E – acredite quem quiser – sei o nome inteiro do Mario. Mario Sumio.


11 comentários:

  1. Le! Augusto! Bixiguenses! voces tem que fazer o mesmo com o Bar do GERA !! em homenagem á historia, aos autênticos bares.. Adoré o Bar de Mario e sua historia!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Caro Emílio, nós teríamos que encontrar alguém que abrisse um Bar do Gera, porque nós, mesmo, não prestamos pra administrar bar. Nós prestamos para manter bares abertos com o nosso humilde dinheirinho rsrsrs.

      Excluir
  2. Que saudade! Do lanche, do Chopp, do balcão, das mesas, das pessoas...

    ResponderExcluir
  3. Espetacular Mario. Uma viagem aquele lugar místico que permanece em nossas memórias, todas saudosas, claro.

    ResponderExcluir
  4. Espetaculo de lanche....saímos eu e minha namorada da fol....eramos monitor de prótese "do dr. Nicacio"....tomava 8/10 chopp.....quanto ao cabelo é veridico.com os 4dedos ele penteava da região temperal para nunca...hummm

    ResponderExcluir
  5. Foi no bar do Mario que comi e conheci o Tremosso, muito bom porém sem sabor de nada rsrsrs
    So restam saudades e lembranças.

    ResponderExcluir
  6. Pratinha vc sempre com suas histórias e comentario impolgantes. O que você contou são coisas que não voltam mais
    Pois o Mario(sem acento) e o Pratinha
    são pessoas unicas e insubstituives. Somente quem viveu o seu conto pode
    dar nota dez com louvorj ao contista e ao personagem. Parabéns amigo há muito não me sentia tão emocionado.
    Obrigado por mais esta alegria.
    Um abraço amigo.


    ResponderExcluir

Muito agradecida!